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COMO ALINHAR PRÁTICAS DO SETOR FARMACÊUTICO À LGPD

A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) consolidou princípios que buscam garantir o tratamento responsável e transparente de dados pessoais. No setor farmacêutico, que lida com informações de saúde de alta sensibilidade, a conformidade com essas diretrizes é não apenas uma exigência legal, mas também um fator de confiança para o consumidor.

A Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) tem reforçado sua atuação fiscalizatória, ampliando a exigência de ajustes internos e impondo medidas corretivas em empresas que não observam os requisitos da lei. Esse movimento reflete a necessidade de se adotar processos claros, políticas consistentes e práticas proporcionais no tratamento de dados pessoais.

Irregularidades identificadas

Em 2025, a ANPD concluiu investigações no setor farmacêutico envolvendo redes de farmácias, federações e programas de fidelidade. A apuração revelou falhas estruturais significativas, como políticas de privacidade desatualizadas ou inexistentes, práticas pouco transparentes e ausência de informações claras ao consumidor. Em termos simples, os clientes eram convidados a fornecer dados sem compreender plenamente como seriam utilizados.

A exigência de CPF para liberação de descontos foi um dos pontos de destaque. Essa prática impede que o consumidor exerça liberdade real de escolha quanto ao compartilhamento de suas informações. Do mesmo modo, a coleta de dados biométricos para autenticação foi considerada desproporcional quando outros mecanismos, menos invasivos, poderiam ser adotados.

Impactos para o setor

A análise da Autoridade mostrou que programas de fidelização, quando mal estruturados, podem gerar inferências sobre o estado de saúde do consumidor. Além da ANPD, o Ministério Público também instaurou procedimentos para apurar os riscos relacionados ao tratamento de dados nessa área, demonstrando que a fiscalização não se limita a um único órgão. Esse alinhamento entre autoridades reforça a necessidade de adequação imediata.

A não conformidade traz riscos concretos: desde sanções administrativas e multas até danos reputacionais de difícil reparação. O comprometimento da imagem e a perda de confiança podem, em alguns casos, ser mais impactantes do que a própria penalidade financeira.

Caminhos para adequação

Para o setor farmacêutico, o desafio é transformar exigências legais em práticas efetivas. Isso exige auditorias internas capazes de mapear fluxos de dados, revisão periódica das políticas de privacidade e adoção de controles técnicos que assegurem integridade, confidencialidade e disponibilidade das informações.

O investimento em treinamento das equipes e em soluções tecnológicas de proteção de dados deve ser contínuo. O monitoramento permanente das operações e a melhoria constante dos processos são medidas que fortalecem a governança e reduzem o risco de novas desconformidades.

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O CPF NO CAIXA DO SUPERMERCADO E OS LIMITES DA PROTEÇÃO DE DADOS

Nos caixas de supermercados, tornou-se rotina o pedido do CPF do consumidor no momento da compra. Em geral, a prática é apresentada como forma de liberar descontos ou permitir a participação em programas de benefícios. O que parece uma formalidade simples, entretanto, envolve implicações relevantes em matéria de privacidade e proteção de dados.

A Lei Geral de Proteção de Dados, em vigor desde 2020, classifica o CPF como dado pessoal e impõe limites claros para sua utilização. Isso significa que, para coletar e tratar essa informação, o estabelecimento precisa de fundamento legal adequado, como o consentimento livre e informado do titular. Mais do que isso, deve deixar explícito como o dado será usado e quais são as garantias oferecidas quanto ao seu tratamento.

O uso do CPF sem transparência ou sem respaldo legal pode representar risco direto à privacidade do consumidor. Entre os direitos assegurados pela legislação, estão a confirmação sobre a existência do tratamento, o acesso às informações registradas, a correção de eventuais erros e a eliminação de dados utilizados de forma irregular. Cabe ao consumidor solicitar a exclusão de seus dados do cadastro da empresa quando verificar finalidades que não condizem com a lei ou quando o consentimento não tiver sido obtido de forma clara.

A fiscalização vem sendo fortalecida pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados, que já dispõe de instrumentos para coibir práticas abusivas. Entre as sanções previstas, encontram-se advertências, multas que podem atingir valores expressivos e até a restrição do uso dos dados pessoais até a correção das falhas.

Em um contexto de intensificação do debate sobre privacidade, o simples ato de informar o CPF na hora da compra ganha novos contornos jurídicos e exige maior responsabilidade das empresas que coletam esses dados. O consumidor, por sua vez, tem instrumentos legais para assegurar que suas informações sejam tratadas de maneira correta e transparente.

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LGPD E DIREITO PENAL: ATÉ ONDE VAI A RESPONSABILIZAÇÃO POR INCIDENTES DE SEGURANÇA

A Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais foi concebida para assegurar a privacidade e estabelecer regras rígidas quanto ao tratamento de informações pessoais. Sua estrutura normativa concentra-se em sanções administrativas e civis, aplicáveis sobretudo pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) e pelo Judiciário em ações indenizatórias. Contudo, ainda que a lei não tenha criado crimes específicos, determinadas condutas relacionadas a vazamentos podem ser enquadradas em tipos penais já previstos no ordenamento jurídico brasileiro.

Quando o incidente resulta de falha técnica, descuido ou acidente, a consequência tende a ficar restrita à esfera administrativa e cível: multas, obrigação de comunicar os titulares e a ANPD, medidas de reparação e, eventualmente, indenização pelos prejuízos sofridos. Nessas hipóteses, inexiste crime, mas subsistem impactos relevantes para a empresa em termos de credibilidade e custos financeiros.

A responsabilidade criminal surge quando há dolo na manipulação, acesso ou divulgação dos dados. Casos de invasão de dispositivos, estelionato praticado em ambiente digital, concorrência desleal e outras práticas previstas no Código Penal e em leis especiais podem alcançar não apenas terceiros mal-intencionados, mas também controladores e operadores de dados que tenham participado, de forma direta ou indireta, do ilícito.

Para mitigar riscos, o caminho mais eficaz é a adoção de um programa estruturado de Compliance Digital. Esse modelo de governança envolve políticas internas claras, protocolos de segurança da informação, auditorias periódicas e, sobretudo, treinamento contínuo de colaboradores para que compreendam a relevância do correto manuseio de informações pessoais e sensíveis.

Entre as principais finalidades desse tipo de programa, destacam-se:

  • assegurar conformidade normativa no uso de tecnologias e dados;
  • garantir integridade e confidencialidade das informações tratadas;
  • reduzir riscos de incidentes como fraudes, vazamentos e ataques cibernéticos;
  • consolidar a reputação institucional e a confiança de clientes e parceiros.

A proteção de dados, portanto, não deve ser vista apenas como cumprimento de uma obrigação legal, mas como parte integrante da governança corporativa. Ao unir tecnologia, gestão e cultura organizacional, a empresa reduz substancialmente a probabilidade de vazamentos e se coloca em posição de defesa mais sólida diante de possíveis sanções administrativas, demandas indenizatórias e até repercussões criminais.

Esse alinhamento entre prevenção, conformidade e segurança não só resguarda juridicamente a organização, como preserva um dos ativos mais valiosos no ambiente empresarial contemporâneo: a confiança.

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PROTEÇÃO DE DADOS NO COTIDIANO: COMO EMPRESAS E ÓRGÃOS PÚBLICOS ENFRENTAM A APLICAÇÃO DA LGPD

A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) completa cinco anos em vigor, mas sua efetiva implementação ainda caminha de forma desigual no Brasil, sobretudo no contexto municipal. Apesar de avanços institucionais e do aumento expressivo de decisões judiciais que citam a legislação — mais de 15 mil apenas na edição mais recente do painel nacional que acompanha o tema — a realidade prática indica que muitas empresas e órgãos públicos ainda operam em níveis variados de maturidade.

Uma das principais barreiras para a consolidação da cultura de proteção de dados é a percepção de que as sanções administrativas ainda não são plenamente aplicadas, o que gera a falsa sensação de que o cumprimento da norma pode ser postergado sem consequências imediatas. Entretanto, o aumento da judicialização e da exigência contratual por conformidade com a LGPD vêm sinalizando mudanças importantes.

Empresas de menor porte, especialmente em cidades de médio e pequeno porte, enfrentam dificuldades maiores. Muitas ainda não conseguem atender de forma plena às exigências, seja por desconhecimento técnico, seja por limitações orçamentárias. Ainda assim, a adaptação avança, sobretudo em setores mais regulados, como saúde, educação e financeiro.

No setor privado, práticas como coleta de dados sem informação clara sobre a finalidade, ausência de consentimento para envio de comunicações, e exposição indevida de informações sensíveis continuam ocorrendo. Tais práticas, além de representar risco jurídico e financeiro, impactam diretamente na reputação institucional e na confiança de clientes e colaboradores.

No setor público, as exigências legais impõem a implementação de medidas efetivas de segurança e governança. A coleta e tratamento de dados sensíveis pela administração municipal ou por órgãos vinculados requer não apenas adequações técnicas, mas também revisão de procedimentos, capacitação de servidores e controle dos fluxos internos.

Entre os riscos associados ao descumprimento da LGPD estão: perda de contratos com empresas que exigem conformidade, judicialização por parte de titulares de dados e sanções administrativas aplicadas pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD). Mais do que isso, há um impacto direto sobre a credibilidade da organização.

Boas práticas recomendadas incluem a revisão de contratos, registro e mapeamento dos fluxos de dados, uso de ambientes seguros, descarte adequado de documentos, anonimização de dados sempre que possível e limitação de acesso conforme o perfil do usuário. Além disso, é essencial que qualquer coleta de dados seja acompanhada de transparência e fundamentação legal.

Duas experiências relatadas ilustram caminhos distintos nesse processo. Uma empresa do setor de tecnologia, atuante no desenvolvimento de softwares de gestão, reforçou seu sistema de proteção de dados com treinamentos periódicos, limitação da coleta de informações e revisão de sistemas. O fortalecimento da cultura de segurança foi um dos pilares dessa transformação.

Por outro lado, um hospital de médio porte enfrentou desafios adicionais. Apesar dos avanços na organização de dados, nas rotinas de recepção e nas práticas de identificação de pacientes, a permanência de processos baseados em papel ainda é um obstáculo. A ausência de sistema de assinatura eletrônica validado e a obrigatoriedade legal de guarda de prontuários por mais de duas décadas exigem investimentos que ainda não foram implementados.

Mesmo com dados digitalizados, a falta de validação eletrônica impõe a impressão de documentos, prolongando a dependência do papel. O hospital, entretanto, já planeja a adoção de soluções tecnológicas até 2026, priorizando a digitalização segura e a conformidade com a LGPD.

A consolidação da proteção de dados como prática institucional passa, portanto, por uma mudança de cultura, não apenas por ajustes pontuais. Proteger informações pessoais exige mais do que adequações técnicas — demanda comprometimento, responsabilidade e compreensão da importância desse direito no ambiente organizacional.

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BOLETOS FALSOS E A IMPORTÂNCIA DA PROTEÇÃO DE DADOS NA PREVENÇÃO DE FRAUDES EMPRESARIAIS

Empresas de todos os setores vêm enfrentando desafios significativos relacionados à segurança financeira, especialmente diante da alta incidência de fraudes associadas a boletos falsos. Dados apontam que milhões de tentativas ocorrem anualmente, gerando impactos bilionários. Quando negligenciam a proteção da informação, as organizações não apenas se expõem a prejuízos diretos, como também comprometem sua credibilidade perante clientes, parceiros e o mercado.

Nesse contexto, a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) deixa de ser apenas um instrumento regulatório para assumir papel estratégico na mitigação de riscos. A correta aplicação dos princípios da LGPD fortalece os controles internos e contribui para a criação de ambientes digitais mais confiáveis e resilientes.

A cadeia de segurança da informação tem como ponto mais sensível o fator humano. Colaboradores, consumidores e prestadores de serviço, quando mal orientados ou sem capacitação adequada, podem inadvertidamente abrir portas para golpes sofisticados. Treinamentos contínuos, políticas de segurança bem definidas e práticas de governança digital tornam-se, portanto, indispensáveis para prevenir incidentes relacionados ao uso indevido de dados.

Conformidade com a LGPD como diferencial empresarial

Além de atender a exigências legais, a conformidade com a legislação de proteção de dados proporciona benefícios reputacionais e operacionais. Empresas que demonstram responsabilidade com a privacidade das informações conquistam maior confiança do consumidor e reduzem a exposição a litígios judiciais. Transparência, consistência e rastreabilidade nos processos são aspectos valorizados por parceiros comerciais e pelo próprio mercado.

A prevenção de fraudes exige mais do que ferramentas tecnológicas. É necessário um compromisso organizacional com processos seguros, monitoramento contínuo e governança orientada pela proteção da informação. A adoção das diretrizes da LGPD deve ser compreendida como parte integrante da estratégia empresarial, sendo a segurança dos dados tão relevante quanto qualquer outro ativo de valor.

A cultura de proteção de dados não apenas fortalece o ecossistema digital da organização, como também projeta um posicionamento ético e responsável frente às transformações regulatórias e tecnológicas da sociedade atual.

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A EVOLUÇÃO DO DIREITO DIGITAL E A DEFESA DA PRIVACIDADE NO MUNDO TECNOLÓGICO

Na atual era digital, a proteção da privacidade se tornou um tema de grande relevância para o Direito. Com a utilização extensiva de dados pessoais por organizações, governos e até dispositivos conectados, como os da Internet das Coisas (IoT), a questão da proteção de dados deixou de ser uma simples questão técnica e passou a ser reconhecida como um direito fundamental dos indivíduos.

A legislação evoluiu significativamente, com a criação de leis como a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) no Brasil e o Regulamento Geral de Proteção de Dados (GDPR) na Europa. Essas normativas estabeleceram novos parâmetros sobre como as empresas devem tratar as informações pessoais, impondo obrigações de consentimento, acesso, exclusão e até a portabilidade de dados. O Direito Digital tem se adaptado para garantir maior transparência, segurança e responsabilidade no uso dessas informações.

A proteção dos dados pessoais foi reconhecida como um direito autônomo, reforçando a necessidade de um controle cuidadoso sobre o uso de tecnologias como algoritmos, inteligência artificial e grandes volumes de dados (big data). A inovação tecnológica deve, portanto, caminhar lado a lado com a preservação da dignidade da pessoa humana.

Entretanto, o avanço rápido das tecnologias digitais traz desafios para a regulamentação. O uso de tecnologias como biometria, reconhecimento facial, criptografia e a aplicação de IA em decisões automáticas exige um acompanhamento regulatório constante, para prevenir abusos e discriminação, além de proteger a privacidade e evitar o vazamento de dados.

O papel do profissional do Direito Digital vai além da interpretação das normas. É fundamental que este entenda o funcionamento das tecnologias, dialogando com especialistas de outras áreas, como TI, para garantir que a privacidade seja tratada de maneira central. A proteção de dados não deve ser vista apenas como uma questão individual, mas como um pilar essencial para a confiança nas relações sociais e econômicas de uma sociedade cada vez mais conectada.

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10 PONTOS PARA SABER SE SUA EMPRESA ESTÁ EM CONFORMIDADE COM A LGPD

A Lei Geral de Proteção de Dados (Lei nº 13.709/2018) representa um marco importante para a governança de dados no Brasil. Mais do que uma exigência legal, estar em conformidade é uma demonstração de respeito às pessoas, aos parceiros comerciais e à própria sustentabilidade do negócio.

Empresários que buscam adequar suas operações devem, antes de tudo, compreender que a proteção de dados não se limita a um documento ou uma política, mas sim a um conjunto de práticas, processos e responsabilidades permanentes.

A seguir, apresentamos 10 pontos que indicam se sua empresa está alinhada às exigências da LGPD:

  1. Mapeamento de dados realizado
    A empresa conhece quais dados pessoais coleta, por qual motivo, onde estão armazenados, quem tem acesso e com quem são compartilhados.
  2. Bases legais bem definidas
    Cada atividade de tratamento de dados está devidamente respaldada em uma das bases legais previstas na LGPD, seja para execução de contratos, cumprimento de obrigação legal ou legítimo interesse, entre outras.
  3. Políticas internas implementadas
    Existe um conjunto de políticas e normas claras, que orientam colaboradores sobre como tratar dados pessoais, incluindo diretrizes sobre segurança da informação, privacidade e acesso.
  4. Consentimento tratado de forma adequada
    Nos casos em que o consentimento é necessário, ele é obtido de forma livre, informada e inequívoca, sendo possível ao titular revogá-lo a qualquer tempo.
  5. Treinamento e conscientização dos colaboradores
    Os colaboradores são capacitados periodicamente, entendendo seus deveres no tratamento de dados e as implicações jurídicas e operacionais envolvidas.
  6. Gestão de riscos e segurança da informação ativa
    A empresa adota medidas técnicas e administrativas para proteger os dados contra acessos não autorizados, vazamentos, perdas e qualquer forma de uso indevido.
  7. Canal de atendimento ao titular de dados estruturado
    Há um canal eficiente para que os titulares possam exercer seus direitos, como acesso, correção, portabilidade, eliminação ou informações sobre o tratamento de seus dados.
  8. Nomeação de um encarregado (DPO)
    Existe uma pessoa designada, interna ou terceirizada, que atua como ponto de contato entre a empresa, os titulares e a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD).
  9. Gerenciamento de contratos com terceiros e fornecedores
    Os contratos firmados com parceiros e fornecedores preveem cláusulas específicas sobre privacidade e proteção de dados, garantindo que todos os envolvidos cumpram a legislação.
  10. Plano de resposta a incidentes implementado
    A empresa possui procedimentos claros para identificar, tratar e comunicar eventuais incidentes de segurança, incluindo, quando necessário, a notificação à ANPD e aos titulares afetados.

Empresas que observam esses pontos não apenas reduzem riscos jurídicos e financeiros, como também fortalecem sua reputação no mercado. A conformidade com a LGPD reflete um compromisso ético com a privacidade e com a proteção das informações que circulam na rotina empresarial.

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MONITORAMENTO DE COLABORADORES: O QUE PODE E O QUE NÃO PODE SEGUNDO A LGPD E A CLT

A relação de trabalho pressupõe não apenas a prestação de serviços, mas também a observância de direitos e deveres recíprocos. Nesse contexto, é natural que as empresas adotem mecanismos para acompanhar as atividades de seus colaboradores. Entretanto, a adoção dessas práticas precisa estar em consonância com os limites legais estabelecidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e pela Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD).

O monitoramento no ambiente corporativo não é, por si só, proibido. Ao contrário, é permitido desde que seja realizado de forma transparente, legítima e proporcional. A própria CLT assegura ao empregador o poder diretivo, que abrange o direito de fiscalizar e orientar os serviços executados pelos empregados. No entanto, esse direito não é absoluto e deve respeitar os direitos fundamentais à intimidade, à privacidade e à dignidade da pessoa humana, protegidos tanto pela Constituição Federal quanto pela legislação trabalhista e pela LGPD.

A Lei Geral de Proteção de Dados impõe parâmetros claros para o tratamento de dados pessoais, inclusive no contexto laboral. O empregador deve informar de maneira clara quais dados serão coletados, para quais finalidades e por quanto tempo serão armazenados. O consentimento, embora não seja, na maioria dos casos, o fundamento adequado na relação de trabalho, dá lugar ao legítimo interesse do empregador, desde que este não sobreponha os direitos e liberdades dos titulares dos dados, ou seja, dos colaboradores.

Monitoramentos como rastreamento de e-mails corporativos, análise de acesso a sistemas internos, registros de ponto eletrônico, videomonitoramento em áreas comuns e controle de acesso físico são, em regra, admitidos. Contudo, é indispensável que essas medidas estejam descritas em documentos internos, como políticas de privacidade, termos de uso dos recursos tecnológicos e manuais de conduta.

Por outro lado, práticas que invadam a esfera da vida privada são consideradas abusivas e, portanto, ilícitas. É vedado, por exemplo, o monitoramento de conversas particulares, inclusive em dispositivos corporativos, se não houver uma política clara que informe os colaboradores sobre os limites de uso desses equipamentos. Monitoramento em banheiros, vestiários, áreas de descanso ou qualquer outro ambiente que comprometa a intimidade também é expressamente proibido.

O Poder Judiciário, tanto na esfera trabalhista quanto nas discussões relacionadas à proteção de dados, tem consolidado entendimento de que o monitoramento deve estar limitado às necessidades da atividade empresarial. Excessos são frequentemente combatidos com decisões que garantem indenizações por danos morais aos trabalhadores, além de possíveis sanções administrativas impostas pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD).

Sendo assim, o caminho seguro para as empresas é a adoção de uma cultura de conformidade. Isso inclui não apenas a formalização de normas internas, mas também a capacitação de lideranças e colaboradores sobre o uso adequado dos dados e dos recursos tecnológicos no ambiente de trabalho. O equilíbrio entre o legítimo interesse empresarial e os direitos dos colaboradores é a medida que assegura a sustentabilidade das relações de trabalho na era digital, protegendo tanto a empresa quanto seus profissionais.

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TITULARIDADE, GUARDA E EXCLUSÃO DE DADOS PESSOAIS EM CONTRATOS EMPRESARIAIS ENCERRADOS

A relação entre empresas e titulares de dados não se encerra com a expiração de um contrato. Muito pelo contrário, a legislação impõe deveres que ultrapassam a vigência do vínculo comercial, especialmente no que diz respeito à guarda e à eliminação de dados pessoais.

Nos termos dos artigos 15 e 16 da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (Lei nº 13.709/2018), a guarda de dados após o término do tratamento só se justifica em hipóteses específicas. O artigo 15 determina que o fim do tratamento ocorre quando atingida a finalidade para a qual os dados foram coletados, quando expira o prazo de tratamento, por comunicação do titular ou por determinação da autoridade nacional. Já o artigo 16 estabelece que a conservação dos dados poderá ocorrer para cumprimento de obrigação legal ou regulatória, estudo por órgão de pesquisa, transferência a terceiro (respeitados os requisitos da lei) ou uso exclusivo do controlador, desde que os dados sejam anonimizados.

Dessa maneira, o encerramento de um contrato impõe às empresas a responsabilidade de revisar os dados pessoais sob sua custódia. Informações que não encontrem respaldo nas hipóteses legais devem ser eliminadas de maneira segura, resguardando os direitos do titular e evitando a exposição indevida de dados sensíveis ou identificáveis. O cuidado neste momento é expressão da boa-fé e do respeito à autodeterminação informativa, princípios estruturantes da proteção de dados no Brasil.

A titularidade dos dados permanece sempre com o indivíduo, ainda que durante a execução do contrato a empresa atue como controladora no exercício regular de direitos. Encerrado o contrato, a manutenção de informações pessoais fora das hipóteses autorizadas constitui não apenas uma infração administrativa, mas também um risco de responsabilidade civil.

Assim, o tratamento adequado dos dados após o encerramento contratual não é um ato de mera formalidade. Exige a adoção de políticas internas claras, mecanismos seguros de eliminação e, sobretudo, o registro documental que demonstre a conformidade das ações adotadas. Como alertava Machado de Assis, “o coração humano é uma casa que se arruma por fora, mas se desarruma por dentro”. O mesmo se pode dizer da governança de dados: é na coerência entre prática e norma que se constrói a confiança.

Cumpre, portanto, às empresas, não apenas no momento da contratação, mas também no encerramento das relações, zelar pelo correto tratamento dos dados pessoais. Trata-se de uma obrigação contínua, que transcende o ato de celebrar ou concluir negócios, sendo um verdadeiro dever de respeito à dignidade e aos direitos fundamentais dos titulares.

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CRIMES DIGITAIS COMETIDOS POR FUNCIONÁRIOS USANDO RECURSOS DA EMPRESA, E AGORA?

A transformação digital nas empresas trouxe avanços operacionais, mas também ampliou as possibilidades de uso indevido de recursos tecnológicos por colaboradores. Em casos cada vez mais frequentes, empresas se deparam com situações em que funcionários praticam ilícitos digitais utilizando dispositivos, redes ou sistemas corporativos. Nesses casos, a responsabilidade empresarial exige atenção técnica e jurídica imediata.

A primeira medida é compreender que o uso de meios corporativos em crimes digitais não torna, por si só, a empresa automaticamente responsável pelos atos do empregado. A responsabilização dependerá da comprovação de que a empresa teve participação, omissão ou falha grave em seus controles internos. Isso não isenta, no entanto, a necessidade de uma investigação interna criteriosa, acompanhada de perícia técnica, que identifique se houve falha de governança ou negligência no monitoramento.

Empresas que implementam políticas claras de uso dos ativos tecnológicos, bem como mecanismos de auditoria e rastreamento, tendem a demonstrar diligência e boa-fé. A existência de um termo de uso aceitável assinado pelos colaboradores, aliados a controles de acesso, sistemas de detecção e um plano de resposta a incidentes, ajuda a evidenciar que a organização não compactua com condutas ilícitas.

Além da esfera trabalhista, é preciso avaliar a repercussão penal e cível. O funcionário pode responder individualmente por crimes como invasão de dispositivo informático, estelionato eletrônico, vazamento de dados e falsidade ideológica, entre outros, previstos no Código Penal e na Lei do Marco Civil da Internet. Já a empresa poderá ser chamada a responder subsidiariamente, em ações reparatórias, se houver demonstração de omissão ou proveito direto dos atos ilícitos.

Do ponto de vista da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), o incidente pode configurar violação de dados pessoais, exigindo notificação à Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) e comunicação aos titulares afetados, conforme o artigo 48 da lei. O dever de transparência e a atuação preventiva são fundamentais para preservar a reputação institucional e evitar sanções administrativas.

Cabe ao corpo diretivo reforçar treinamentos, revisar contratos de trabalho, atualizar normas internas de segurança e reavaliar o desenho de sua governança digital. A integridade das operações e a confiança no ambiente de trabalho passam pela clareza das regras e pela firmeza na responsabilização de condutas que ultrapassam os limites éticos e legais.

A resposta adequada a esse tipo de conduta parte da prevenção, passa pela ação imediata e se conclui na melhoria contínua dos processos. Empresas que tratam esse tipo de ocorrência com seriedade não apenas evitam prejuízos jurídicos, mas também demonstram seu compromisso com a ética e a segurança no ambiente corporativo.

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COMO A LGPD AFETA EMPRESAS QUE NÃO COLETAM DADOS DE CLIENTES?

A ideia de que a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) só se aplica a empresas que lidam diretamente com dados sensíveis ou grandes volumes de informações de clientes ainda é bastante comum. Muitos empresários acreditam que, por não operarem ecommerces ou plataformas digitais, estão fora do alcance da legislação. Essa percepção, no entanto, precisa ser revista com urgência e responsabilidade.

A LGPD não se restringe ao tratamento de dados sensíveis nem ao setor de tecnologia. Ela se aplica a qualquer operação que envolva dados pessoais, o que inclui informações de colaboradores, prestadores de serviço, fornecedores e até candidatos a vagas de emprego. Um simples currículo arquivado já configura tratamento de dados. Uma planilha com nomes, telefones e e-mails de parceiros comerciais também.

Mesmo que uma empresa não colete dados de clientes no sentido clássico, como formulários de contato, cadastro em sites ou vendas online, ela ainda assim lida com dados pessoais em suas rotinas administrativas. E esses dados precisam ser protegidos com base nos princípios da boa fé, finalidade, necessidade e segurança previstos na LGPD.

Outro ponto pouco debatido, mas extremamente relevante, é a responsabilidade solidária prevista na legislação. Isso significa que, mesmo terceirizando operações como contabilidade, folha de pagamento ou suporte de TI, a empresa continua responsável pelo tratamento adequado dos dados compartilhados com terceiros. A LGPD exige não apenas cuidado com os dados internos, mas também diligência na escolha e fiscalização de quem os acessa externamente.

Ignorar a lei pode acarretar advertências, sanções financeiras e, mais grave ainda, danos à reputação. Empresas que demonstram cuidado com a privacidade transmitem confiança, e num ambiente empresarial competitivo, isso representa um valor concreto.

Mais do que uma obrigação legal, a proteção de dados deve ser vista como parte de uma cultura organizacional ética e respeitosa. Não se trata apenas de cumprir normas, mas de compreender o valor das informações que circulam dentro da empresa, ainda que elas não estejam na vitrine.

Desconstruir esse mito é um passo necessário para que as empresas adotem uma postura preventiva e madura. A LGPD não é uma lei distante, aplicável apenas às gigantes da tecnologia. Ela está na rotina de qualquer organização que pretenda operar com segurança jurídica e responsabilidade social.

Toda empresa, em algum momento, trata dados pessoais. Reconhecer isso é o primeiro passo para estar em conformidade e para demonstrar respeito pelas pessoas que fazem parte da sua operação.

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ACCOUNTABILITY DIGITAL: O PAPEL DA SUA EMPRESA NO CONTROLE DOS DADOS COMPARTILHADOS

Compartilhar dados com fornecedores, consultorias ou plataformas terceirizadas é uma prática comum em empresas de todos os setores. No entanto, essa troca de informações não pode ocorrer sem critérios claros. A Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) exige que as organizações adotem uma postura responsável, e um dos pilares desse dever é o princípio da accountability digital.

Na prática, isso significa que toda empresa que coleta, armazena ou compartilha dados pessoais deve estar preparada para demonstrar, com clareza e transparência, como protege essas informações e com quem as compartilha. Não se trata apenas de confiar na boa-fé de parceiros comerciais. É necessário verificar, acompanhar e, sobretudo, documentar as práticas adotadas por todos os envolvidos.

Os dados não permanecem estáticos. Eles circulam por diversos sistemas, são acessados por diferentes equipes e podem atravessar fronteiras digitais e organizacionais. Quando isso acontece, é como se cada parceiro se tornasse um elo de uma corrente. Se um deles falhar, a responsabilidade pode recair sobre quem iniciou o tratamento, ou seja, sobre a sua empresa.

Nesse contexto, manter contratos bem estruturados, solicitar evidências das medidas de segurança adotadas e revisar periodicamente os procedimentos dos parceiros são atitudes que demonstram seriedade e compromisso. Mais do que evitar sanções, essas práticas ajudam a construir uma cultura de respeito à privacidade e à proteção das pessoas que confiam seus dados à sua empresa.

Adotar o princípio da accountability digital é, portanto, uma demonstração concreta de maturidade organizacional. É dizer, com ações, que sua empresa sabe onde os dados estão, quem tem acesso a eles e o que está sendo feito para protegê-los. Isso não apenas atende à legislação, mas também preserva a reputação do negócio e a confiança dos seus clientes.

Em tempos de transformação digital, ser responsável com os dados é, antes de tudo, ser respeitoso com as pessoas.