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O QUE DIZ A LEI SOBRE O USO DOS SEUS DADOS PELAS INTELIGÊNCIAS ARTIFICIAIS

A difusão das plataformas de inteligência artificial generativa tem transformado significativamente a interação dos usuários com as tecnologias digitais. Desde sua adoção em larga escala, modelos como o ChatGPT, desenvolvidos por empresas americanas, destacam-se pela capacidade de fornecer respostas coerentes e precisas, conquistando rapidamente usuários em diversas regiões, incluindo o Brasil.

Por outro lado, modelos provenientes da China chamaram a atenção inicialmente por sua eficiência técnica, mas também geraram debates relacionados à transferência de dados pessoais para servidores localizados naquele país, levantando questionamentos sobre privacidade e segurança da informação.

O debate sobre regulação e proteção de dados envolvendo essas tecnologias está em constante desenvolvimento. Assim, a reação do público e dos órgãos reguladores varia conforme a origem da plataforma e as práticas adotadas. Independentemente dessas diferenças, é fundamental observar com atenção qualquer transferência de dados pessoais para fora do território nacional, considerando o destino das informações e o cumprimento das normas aplicáveis.

Essa discussão envolve não apenas aspectos regulatórios, mas também questões relacionadas à geopolítica e à regulação do fluxo internacional de dados. Dado que os conflitos entre grandes potências ultrapassam a esfera das normas de proteção de dados, o foco desta análise será restrito à regulação da transferência internacional de dados pessoais, tema relevante para todas as plataformas de inteligência artificial generativa acessíveis no Brasil.

No ordenamento jurídico brasileiro, a transferência de dados pessoais para outros países está submetida à Lei Geral de Proteção de Dados (Lei nº 13.709/2018). Os artigos 33 a 36 estabelecem que esse tipo de transferência só pode ocorrer mediante cumprimento de condições específicas previstas na legislação, como a existência de decisão de adequação da autoridade reguladora, consentimento expresso do titular ou a utilização de cláusulas contratuais padrão aprovadas pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD).

Em agosto de 2024, a ANPD publicou norma regulamentadora detalhando procedimentos para reconhecimento de países e organismos considerados adequados, assim como para a disponibilização de cláusulas-padrão e avaliação de outras ferramentas regulatórias. Entretanto, mecanismos de transferência previstos na lei que não dependam de regulamentação continuam vigentes, desde que cumpram os requisitos legais.

Cabe destacar que a regulamentação diferencia a coleta internacional de dados, quando a empresa obtém os dados diretamente em outro país, da transferência internacional, que ocorre quando um controlador envia dados sob sua posse para o exterior.

Os sistemas de inteligência artificial generativa mencionados encontram-se sob a vigência da LGPD, o que impõe às empresas responsáveis a observância dos princípios e regras, principalmente quanto à transparência sobre os tratamentos realizados.

Dessa forma, é esperado que os termos de uso e, principalmente, as políticas de privacidade informem claramente quais mecanismos legais fundamentam as transferências internacionais de dados pessoais, conforme o princípio da transparência previsto na legislação brasileira.

Por meio de um estudo recente realizado em parceria com um centro de tecnologia e sociedade, foram avaliadas as práticas de transparência de diversas plataformas de inteligência artificial generativa. A pesquisa identificou que a maioria dos serviços não fornece informações claras sobre os mecanismos utilizados para transferência internacional de dados, tampouco detalha os países que recebem essas informações.

Um exemplo elucidativo é o modelo chinês que, conforme sua política de privacidade, não esclarece adequadamente quais dados pessoais são enviados a servidores locais ou retransmitidos para outras regiões, o que tem gerado questionamentos regulatórios e notificação por autoridades internacionais.

No mesmo sentido, a plataforma americana, embora utilize servidores em território norte-americano para transferência de dados, não tem enfrentado o mesmo grau de questionamento público. Sua política de privacidade também deixa lacunas em relação à explicitação dos mecanismos adotados para a transferência internacional.

Importa mencionar que, ao contrário da China, os Estados Unidos não dispõem de legislação federal específica sobre proteção de dados pessoais nem de autoridade reguladora dedicada ao tema, o que reflete em dificuldades para a celebração e manutenção de acordos internacionais de proteção, como evidenciado por decisões recentes de tribunais europeus.

Os acordos em vigor entre Estados Unidos e União Europeia não têm validade para o Brasil, o que reforça a necessidade de observância rigorosa da legislação nacional para todas as transferências internacionais de dados.

Ao analisar as demais plataformas avaliadas, verifica-se que o quadro de insuficiência de transparência e conformidade regulatória é generalizado, independentemente do país de origem.

Por mais que algumas dessas tecnologias ainda não recebam ampla atenção do público, o tema da proteção de dados merece constante monitoramento pelas autoridades brasileiras. A percepção pública acerca da segurança das informações parece estar mais relacionada a fatores culturais e políticos do que a uma avaliação técnica aprofundada.

A preocupação com a coleta e transferência internacional de dados pessoais não é nova. Desde o final do século passado, temas ligados ao controle de dados financeiros e, atualmente, ao uso intensivo de informações pessoais em dispositivos móveis, evidenciam a relevância da proteção de dados.

A inovação tecnológica amplifica o alcance do monitoramento, aumentando a exposição dos titulares a riscos relacionados à privacidade e à segurança, especialmente em um contexto de compartilhamento internacional de informações entre empresas privadas e entes governamentais.

Diante disso, é fundamental que a sociedade e os órgãos reguladores no Brasil mantenham atenção contínua sobre todas as plataformas tecnológicas operantes no país, exigindo cumprimento rigoroso das normas de proteção de dados pessoais. É importante evitar julgamentos baseados apenas na origem geográfica das empresas ou em sua popularidade, priorizando critérios técnicos e legais para assegurar a proteção dos direitos dos titulares.

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COMPLIANCE PENAL DIGITAL: A PROTEÇÃO EMPRESARIAL CONTRA RISCOS CRIMINAIS NO AMBIENTE VIRTUAL

O ambiente empresarial moderno exige uma postura responsável e preventiva diante dos riscos legais, especialmente no universo digital. As empresas, independentemente do porte ou segmento, estão cada vez mais expostas à possibilidade de serem responsabilizadas por atos ilícitos praticados por terceiros, colaboradores ou fornecedores, sobretudo no meio digital.

O ordenamento jurídico brasileiro já prevê a responsabilidade penal da pessoa jurídica em determinados casos. No entanto, quando falamos de delitos digitais, o desafio se torna ainda mais complexo, considerando a velocidade das informações, a diversidade dos meios tecnológicos e a dificuldade na identificação dos autores de práticas criminosas.

Fraudes eletrônicas, vazamento de dados, lavagem de dinheiro por meios digitais, estelionatos praticados em nome da empresa ou até o uso indevido de sistemas corporativos para atividades ilícitas são exemplos de condutas que podem envolver direta ou indiretamente uma organização. E, ainda que a empresa não tenha participação direta nesses atos, ela pode ser investigada, sofrer bloqueios judiciais, sanções administrativas e, muitas vezes, enfrentar abalos irreparáveis em sua reputação.

Diante desse contexto, a implementação de um programa robusto de compliance penal digital se mostra indispensável. Este conjunto de medidas preventivas visa mapear os riscos, estabelecer protocolos de segurança e definir padrões éticos claros para todos os envolvidos na operação empresarial.

A primeira medida é a elaboração de políticas internas que tratem especificamente do uso adequado de recursos tecnológicos, da proteção de dados e da comunicação eletrônica. Isso inclui treinamentos periódicos, cláusulas contratuais rigorosas com colaboradores e fornecedores e o monitoramento contínuo das atividades digitais no ambiente corporativo.

Além disso, é fundamental que a empresa adote mecanismos de due diligence na contratação de terceiros, avaliando não apenas a capacidade técnica, mas também a integridade dos parceiros de negócios. A negligência na escolha de fornecedores ou prestadores de serviços pode implicar em corresponsabilização por atos ilícitos cometidos por eles no exercício da atividade empresarial.

A atuação conjunta dos setores jurídico, de tecnologia da informação e de governança é indispensável para o fortalecimento da cultura de integridade digital. Ferramentas de monitoramento, auditorias internas e canais de denúncia eficazes complementam o sistema de prevenção, oferecendo à empresa meios para detectar e reagir rapidamente a qualquer indício de conduta criminosa.

É importante lembrar que o compromisso com a ética e a conformidade não deve se limitar ao atendimento das exigências legais. Ele representa, sobretudo, uma estratégia de proteção dos próprios negócios, da continuidade operacional e da credibilidade da marca no mercado.

A empresa se posicionando no combate aos crimes digitais, protege seus interesses, contribui de forma efetiva para a construção de um ambiente empresarial mais seguro, ético e sustentável.

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TELETRABALHO, HOME OFFICE E BYOD: COMO PROTEGER SUA EMPRESA DE PASSIVOS TRABALHISTAS E DE SEGURANÇA DA INFORMAÇÃO

A adoção do teletrabalho e do home office se consolidou como uma prática comum nas relações empresariais, trazendo benefícios significativos tanto para empresas quanto para colaboradores. Entretanto, esse modelo de trabalho exige das organizações uma atenção redobrada quanto ao cumprimento da legislação trabalhista e à proteção de dados e informações sensíveis.

Do ponto de vista jurídico, o teletrabalho deve estar formalmente pactuado por meio de contrato ou aditivo contratual, observando as disposições dos artigos 75-A a 75-E da Consolidação das Leis do Trabalho. A ausência desse instrumento pode gerar passivos trabalhistas, especialmente no que diz respeito ao controle de jornada, ao fornecimento de infraestrutura e às despesas decorrentes da atividade profissional exercida fora das dependências da empresa.

Além disso, o modelo BYOD (sigla para Bring Your Own Device, que permite ao colaborador utilizar dispositivos pessoais para fins profissionais) introduz desafios adicionais no campo da segurança da informação. A Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) exige que as empresas adotem medidas técnicas e administrativas capazes de proteger os dados pessoais contra acessos não autorizados e situações acidentais ou ilícitas de destruição, perda, alteração ou vazamento.

É indispensável que a empresa implemente políticas internas claras, como Política de Segurança da Informação, Termo de Confidencialidade e Acordo de Uso de Dispositivos Pessoais. Esses documentos devem estabelecer, de forma objetiva, as responsabilidades dos colaboradores quanto ao uso dos sistemas corporativos, armazenamento de informações e acesso remoto aos dados da empresa.

No âmbito tecnológico, recomenda-se investir em ferramentas de proteção como VPNs, criptografia, autenticação multifatorial e gestão de acessos. Essas práticas reduzem significativamente o risco de vazamento de dados e ataques cibernéticos, protegendo tanto os ativos digitais quanto a reputação da organização.

Sob o aspecto preventivo, o treinamento dos colaboradores exerce papel fundamental. A conscientização sobre boas práticas de segurança, aliado ao esclarecimento de direitos e deveres no teletrabalho, é uma medida que contribui para mitigar riscos jurídicos e operacionais.

A conjugação de medidas jurídicas, administrativas e tecnológicas, resguarda a empresa contra eventuais demandas trabalhistas, fortalece sua governança corporativa, sua reputação e seu compromisso com a proteção de dados e informações sensíveis.